A quântica descola (literalmente)

"I think I can safely say that nobody understands quantum mechanics." – Richard Feynman

Cuántica

Com esta frase célebre, tantas vezes retirada do seu contexto original, Feynman pretendia sublinhar que a mecânica quântica desafia a nossa intuição, construída com base na experiência do dia a dia, afastada do universo do muito pequeno, muito frio e altamente isolado. Ainda assim, os seus princípios são profundamente compreendidos, permitindo-nos desenvolver tecnologias com impacto tangível na sociedade.

Na GMV, não só compreendemos a mecânica quântica como a aplicamos para transformar o setor espacial.

Desde a distribuição quântica de chaves para comunicações seguras, à otimização da captura de imagens por satélite, as tecnologias quânticas deixaram de ser uma curiosidade teórica para se tornarem ferramentas essenciais no espaço, dando o salto do laboratório para a órbita.

Exploramos a seguir como a GMV está a liderar esta revolução no setor espacial, com projetos inovadores nas áreas das comunicações, metrologia, navegação e computação quânticas.

Duas revoluções quânticas e o seu impacto no espaço

O desenvolvimento das tecnologias quânticas ocorreu em duas grandes vagas:

A primeira revolução tecnológica impulsionada pela quântica baseou-se na aplicação de princípios quânticos latos, frequentemente descritos de forma semiclássica. Exemplos destas tecnologias são os transístores, pilares da eletrónica moderna, incluindo os sistemas integrados em satélites; os relógios atómicos, essenciais em sistemas de navegação por satélite como o Galileo e em qualquer contexto onde seja necessária  sincronização com precisão inferior ao nanossegundo; e os lasers, utilizados em comunicações óticas com engenhos espaciais.

A segunda vaga, já neste século, aproveita fenómenos subtis e intimamente quânticos, como a sobreposição, o entrelaçamento, a interferência e o efeito túnel para desenvolver tecnologias de vanguarda.

Caramuel: distribuição quântica de chaves a partir do espaço

A distribuição quântica de chaves (QKD na sigla inglesa) permite estabelecer canais de comunicação teoricamente invioláveis, graças à própria natureza da mecânica quântica.

Embora a QKD tenha sido implementada principalmente sobre fibra ótica, a sua aplicação no espaço oferece vantagens importantes, apesar de também representar desafios técnicos significativos.

Após projetos pioneiros como o satélite chinês Micius ou a missão europeia Eagle-1 (para a qual a GMV desenvolveu o centro de controlo), surge agora uma iniciativa espanhola que procura proporcionar um serviço comercial de QKD a partir da órbita geoestacionária.

A GMV participou no Caramuel, a fase de estudo de viabilidade e conceção preliminar deste projeto, sendo responsável pelo segmento terrestre do sistema, incluindo a destilação das chaves, gestão da cadeia criptográfica, controlo do satélite e estações óticas, assim como a planificação da missão.

Caramuel

Carioqa: sensores quânticos no espaço

A metrologia quântica utiliza sensores quânticos, altamente sensíveis às variações do meio envolvente para medir grandezas físicas com uma precisão nunca antes vista. 

O projeto Carioqa (Cold Atom Rubidium Interferometer in Orbit for Quantum Accelerometry) tem como objetivo conceber, construir, qualificar e lançar, em 2030, o primeiro acelerómetro quântico no espaço. Este instrumento permitirá medir pequenas variações no campo gravitacional da Terra causada pelo degelo dos glaciares, movimentos tectónicos e variações da água subterrânea. Para além disso, como resultado científico "colateral", a missão permitirá comprovar, com uma precisão sem precedentes, o princípio de equivalência débil.

A GMV contribui para Carioqa com a análise da missão.

Carioqa

Quantico: navegação quântica segura a partir do espaço

Os sistemas atuais de Posicionamento, Navegação e Tempo (PNT) a partir do espaço enfrentam ameaças como o spoofing (suplantação de sinal) ou o jamming (interferências). 

A resposta a estes desafios pode estar na tecnologia quântica.

Na GMV concebemos, desenvolvemos e validámos o Quantico, um protótipo que combina metrologia quântica com técnicas inspiradas na distribuição quântica de chaves, permitindo medir, com elevada precisão e segurança, a diferença de tempo entre dois relógios e o seu pseudointervalo associado.

Em testes de laboratório e em campo, simulando condições de órbita baixa, alcançamos uma precisão de 6 cm no cálculo de pseudointervalos, resultado que posiciona o Quantico como uma alternativa viável para sistemas de navegação por satélite mais seguros.

Quantico

CUCO: computação quântica para desafios no espaço

Embora a computação quântica ainda se encontre numa fase inicial (a GMV instalou, em 2023, o primeiro computador quântico em Espanha), o seu potencial para a indústria já está a ser explorado. 

Neste contexto, a GMV lidera o CUCO, um projeto de investigação aplicada centrado no desenvolvimento de algoritmos quânticos para setores estratégicos.

Um dos casos práticos mais promissores é a planificação de satélites de observação da Terra (Satellite Mission Planning Problem, SMMP). A seleção de imagens ótimas a captar, respeitando restrições de tempo, capacidade de armazenamento e geometria orbital, representa um desafio de otimização combinatória, uma variante do problema da mochila.

Analisámos mais de 30 cenários e testámos diferentes tecnologias quânticas, incluindo máquinas de recozimento da D-Wave, algoritmos híbridos quântico-clássicos e otimização quântica variacional.

Os resultados obtidos foram promissores e, apesar de ainda estamos longe de demonstrar uma vantagem quântica em aplicações práticas, a computação quântica abre novas possibilidades para a planificação de missões espaciais.

Cuco

Da teoria quântica ao espaço

“Nature isn't classical, dammit, and if you want to make a simulation of nature, you'd better make it quantum mechanical.” - Richard Feynman

E na GMV sabemo-lo bem.

As tecnologias quânticas deixaram o laboratório para passarem a fazer parte da engenharia aplicada, e a sua integração no setor espacial de forma sólida e consistente. 

O futuro quântico do espaço já começou, e a GMV continua na linha da frente.

Autor: Juan Carlos Gil

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